Sabes, meu caro, não fui eu que te amei.
Tu é que me fizeste isto. Eu não escolhi
nada disto. Ninguém me deu a preferir. Não me puseram nenhum boletim à frente
onde assinalar o quadradinho, não foste resultado de nenhum tipo de raciocínio
lógico, nem de sucessivas tentativas de experimentação que levassem a um
resultado científico; nem tão pouco me chegou uma carta ao correio a avisar que
isto me ia acontecer – que tu me ias acontecer. Não. Nada de Exma. Inês, nem
Cumprimentos muito Seus, nada. Não fui eu que te escolhi. Não fui eu que te
amei.
Tu escolheste. Tu escolheste-me. Tu
sabias quem eu era. Tu escolheste amar-me, com perfeita sanidade.
Eu estive sempre e só apaixonada por uma
ideia. O que, acredites ou não, é muito comum acontecer-me. Apaixona-me a ideia
de viajar por esse mundo fora. Sou loucamente doida pela ideia de conhecer
pessoas novas. Amo a ideia de ir aqui, ser aquilo. Também tu foste uma ideia –
a ideia que eu tinha de ti. Algo ilusório, e que, tal como todos os sonhos, foi
esquecido na manhã seguinte. Mas sabes, a minha noite tua foi longa. O sonho ia
demorado. E até era daqueles em que sabemos que estamos a dormir, sentimos os
lençóis por cima do corpo e as zonas frias do colchão quando mexemos os pés,
mas continuamos a sonhar.
Tu eras daquelas ideias tipo erva
daninha. Regaste-te sozinho e apanhaste sol quando eu acordei, e foste deixando
sementes.
Mas como posso eu amar uma ideia que
nunca se concretizou? É que as ideias, meu caro, ou se realizam ou se deitam
fora, e tu, já foste para a reciclagem. Separado por bocadinhos – a tua parte,
a tua parte que é minha, a minha parte que é tua. Mais o resto. E algumas
migalhas que caíram fora do caixote.
Não me culpes meu caro. Não fui eu quem
te amou. Nem foi a ti que te amei. Não me culpes. Eu nem queria. Eu só estive
apaixonada pela ideia que tive de ti. Não me atires os pesos que tens nas
costas à cara. Não me culpes por deixares que a máscara que levas seja o que as
outras pessoas entendem pela tua nudez. E dá-me as minhas coisas de volta – as
palavras que te disse, as roupas que fui tirando da minha alma camada a camada,
só para ti; as horas que te gastei, eu quero os meus segredos de volta. E a
minha saudade…oh, quantas saudades que tive de ti, ou de quem pensei seres tu.
Tive saudades de uma ideia, vê lá… tudo me parece tão estúpido agora. Dá-me as
minhas coisas de volta. Podes ficar com os meus sonhos, para que fiquemos em pé
de igualdade. Mas
deixa-me dormir.
...só discordo de uma coisa. As ideias nunca se deitam fora. As ideias guardam-se bem guardadas, um dia vão ser concretizadas... Excelente, Inês. Parabéns bjs TZ
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